Conversa com psicólogo sobre a influência da tecnologia na saúde mental.
Com os avanços tecnológicos, diversas áreas, como o trabalho, o entretenimento e a comunicação, sofreram significativas transformações. No entanto, junto a essas mudanças, novos desafios foram desenvolvidos no modo de vida da sociedade, principalmente no que diz respeito ao uso de redes sociais. Elas influenciam a forma como as relações acontecem na atualidade e contribuem para o surgimento de fenômenos psicológicos que impactam o bem-estar e a saúde mental.
O uso excessivo e a necessidade de estar conectado o tempo todo pode levar a uma dependência com relação às telas e, consequentemente, provocar transtornos, como ansiedade e compulsão. Hemerson de Paula, psicólogo com experiência no tratamento de dependências e saúde mental, explica que “as pessoas começam a enxergar nas redes sociais uma forma de preencher aquilo que falta nelas. É o que acontece com o encontro com a droga, com as compras, com a comida, com o sexo. Ou seja, o que acontece com o objeto ‘droga’”.
O psicólogo destaca que, por meio das redes e das interações, como curtidas e comentários, as pessoas ganham o que elas gostariam de receber no contato interpessoal do dia a dia, como se preenchessem um vazio.
O medo da desatualização e a suspensão do X/Twitter no Brasil
No dia 30 de agosto, o X, antigo Twitter, foi suspenso em todo o território brasileiro pelo Supremo Tribunal Federal (STF) após o descumprimento da ordem de indicar um representante legal da empresa no país. A impossibilidade do acesso à plataforma provocou a migração dos usuários para outras redes, como o BlueSky, que alcançou mais de 1 milhão de novos usuários no segundo dia após a suspensão, de acordo com a conta oficial da plataforma.
A rápida mudança refletiu o medo dos usuários de ficarem sem sua fonte de entretenimento e atualizações. “A gente vê a abstinência com a suspensão temporária do antigo Twitter, o X. As pessoas tentam usar o BlueSky, mas não é a mesma coisa”, aponta o psicólogo.
A necessidade constante de estar conectado e o receio de não saber o que acontece nas redes caracterizam um fenômeno psicológico chamado Fear Of Missing Out (Fomo), traduzido como “medo de perder”. O pavor em estar desconectado desencadeia efeitos no bem-estar mental dos indivíduos, como a ansiedade e a sensação de abstinência, quando não é possível manter essa conexão.
“Hoje, a dependência do celular e das redes sociais é uma das dependências mais difíceis de serem tratadas, porque a tela está acessível e disponível. De início, ela não traz nenhum comprometimento, porque o problema não é as redes sociais, é o uso que se faz delas”, destaca De Paula.
O psicólogo argumenta que um corte abrupto na dependência, como a suspensão do X, por exemplo, não é uma solução. Seria semelhante a tirar a droga de um usuário e interná-lo compulsoriamente. Em casos problemáticos, o ideal é fazer uma redução de danos acompanhada do tratamento terapêutico.
Para além da dependência e da compulsão, as redes sociais também podem levar a outras questões, como problemas de autoestima e qualidade de vida. Isso porque muitos usuários acabam se comparando com o que acreditam ser a rotina e o perfil de influenciadores digitais e demais pessoas que apresentam nas plataformas apenas recortes do seu dia a dia, geralmente, os aspectos bons, o que causa a ilusão de que todos ao redor têm uma vida perfeita, menos você. O burnout, transtorno causado pelo excesso de trabalho, também pode ser outro problema para quem trabalha utilizando a tecnologia e se sente “cobrado” em responder mensagens ou criar conteúdos.